emboscada.
"Um cervo jamais sabe sob quais folhas se esconde a emboscada."
Eram essas as letras negras sobre a tela vermelho-sangue que lhe atordoavam o sono. À direita, um cervo inerte aceitava a sentença.
Seria ele também um cervo desavisado, desprovido de malícia numa selva de armadilhas? Tentava dormir, inutilmente. Via os dois lados da cama repetidamente, alternadamente. E quando os olhos fechados, o animal morto lhe surgia em flashes sem cor, compondo uma cena fúnebre que ele tentava entender; culpava o pintor daquele quadro por cruzar o seu caminho, tirando-lhe a paz necessária. Precisava dormir. Acordaria às cinco e trinta, num movimento de um só ato, sem rastejar até a primeira atividade do dia.
Primeiro, um café açucarado, feito em dois tempos, sem que pudesse se dar conta que chegara, enfim,a luz do dia.Depois, um banho gelado, enquanto sonhava com uma água morna qualquer lhe invadindo o corpo, sem que precisasse, contudo, penetrar qualquer cavidade. Abriu os olhos ainda hiperbólicos de sono e viu o cervo duplicado pela parede de vidro que os sepava em lados opostos irreais.
Sentia as folhas úmidas roçando a palma dos pés.
O animal já tinha os pés no chão e os olhos vivos. Ele o encarava docilmente apontava displicente o caminho certo entre os troncos e cadáveres de árvores retorcidas. Dava pistas silenciosas e ele as seguia cegamente, sem esboçar sequer uma palavra.
E numa das infinitas esquinas indefiníveis da floresta, perdeu de vista o divino bicho que lhe a pontava direções. Pensou em voltar, refazer o caminho, mas desistiu logo em seguida. Resolveu seguir solo. E, como que houvesse renascido, teve certeza de cada curva, e toda dúvida sinuosa se dissipou.
Havia esquecido o início, já não lembrava do cervo amigo, muito menos de estranheza daqueles troncos molhados: todo o caminho parecia se abrir à sua frente.
Num movimento qualquer, viu pistas dispostas em trechos duvidosos, em frutas e sementes de cores multicoloridas. O ar lhe faltou subitamente, como se um compressor às avessas lhe sugasse tudo que fosse possível. Sentiu um enlace fervendo-lhe os tornozelos e, num instante quase posterior, viu o mundo em verde-musgo girando , misturando os tons apaziguados, quase em cor de terra fria. Cento e oitenta graus e lá estava ele com os olhos cinlantes, vendo tudo invertido e percebia o ocaso da sua respiração, dos seus pulsos contra o enlace que já não fervia seus tornozelos e, pouco a pouco, foi apagando do. E dormiu. Como já não dormia a semanas.
domingo, junho 12, 2011
Assinar:
Postar comentários (Atom)
Nenhum comentário:
Postar um comentário